Efeito Jabulani
Exame Anpec

Efeito Jabulani



A bola da atual copa do mundo desde o começo das disputas tem dado o que falar. A pergunta que não quer calar é: "Qual efeito uma bola pode ter nos resultados dos jogos?" Ao que me parece, a Jabulani é uma bola tecnológica. Dentro das especificações mínimas de peso, ela foi feita para ser mais leve e mais "viva" e com isso dar mais agilidade aos jogos e balançar mais vezes as redes. Parece que realmente ela tem dado trabalho aos goleiros, feitos uns e outros frangueiros passarem por alguns vexames.

Até o momento em que estamos, no primeiro jogo das oitavas de finais (Uruguai ganhou de 2x1 da Coréia do Norte), essa copa da África do Sul está conseguindo superar a copa de 1990 em baixa média de gols. A copa da Itália é conhecida como a copa que teve a menor média histórica de gols por partida, apenas 2,21. Entre os analistas de futebol, o que mais ajuda explicar a baixa média de gols da copa de 90 foi uma mudança tática do esporte, os times passaram a valorizar atletas com muito preparo que corriam o campo todo e se defendiam bem, o gol era o detalhe do contra-ataque. A copa de 1990 foi um evento pontual, a média de gols em copas do mundo vêm caindo com mais força desde 1958, que foi o ano do primeiro título do Brasil.

Nessa copa há a questão da nova bola. Nos jogos estão comuns os erros de passes e chutes errados pra fora do gol, chutes que parecem ser devidos a uma falta de adequação entre a prática dos jogadores e as características da nova bola. Aparentemente mais ágil, ela requer mais técnica e menos força. Foram vistos muitos escanteios em que a bola cruzou toda a grande área.

Sem dúvida há um pequeno efeito Jabulani (mínimo mesmo), mas como poderiamos medi-lo com precisão? Essa é uma questão importante e recorrente nas ciências sociais. Não existe contrafactual, ou o contrafactual não faz muito sentido. Imagine que para testar a nova bola alguns jogos fossem realizados com a Jabulani e outros realizados com a Teamgeist (bola da copa anterior). Ao final da copa comparariamos a média de gols por partidas obtidos com cada uma das bolas e veriamos se essa diferença é estatisticamente significativa.

Eu acredito que muito provavelmente não haveria diferença nenhuma, mas o fato é que a mesma bola é usada indistintamente em todas as partidas, então não há como fazer essa comparação. Só dá pra fazê-la daqui em diante, comparar essa copa com as copas seguintes. Se uma bola parecida com a Jabulani for usada na copa do Brasil em 2014, como será a média de gols? Maior, menor ou igual a atual? E se comparássemos a Jabulani com aquelas antigas bolas de couro dos anos 50, será que ainda assim não teriamos diferença?

O ex-jogador Sócrates quer defender um mestrado com uma tese um tanto excêntrica: ele quer mudar o número de jogadores de 11 para 9 (8 além do goleiro). Na verdade, o economista Mario Henrique Simonsen já tinha sugerido uma brincadeira como essa durante a copa de 1990. Sócrates pretende medir algumas características do jogo com e sem essa intervenção, um dia eu assisti entrevista em que ele fala que precisaria de dinheiro e mais ou menos uns trezentos jogos com jogadores profissionais para ver se a medida realmente resultaria naquilo que gostamos de ver: mais dribles, mais movimentação e mais gols. Essa é uma medida mais dramática do que a simples mudança de bola, provavelmente os impactos para o esporte serão tremendos, resta saber se favoráveis.


Mesmo no exemplo mencionado de jogos com Jabulani e jogos com outra bola, a comparação não seria nada fácil. Um jogo Brasil e Portugal não tem as mesmas características de Portugal e Coréia do Norte. Como comparar jogos entre seleções diferentes? As características influentes no resultado de uma partida são tantas que a comparação seria um tanto impossível mesmo se tivessemos Portugal e Brasil (com Jabulani) e Portugal e Brasil (sem Jabulani). Há inumeras variáveis não observáveis. Digamos que a primeira partida fosse o micho 0x0 que ocorreu de fato e a segunda fosse 3x3. Ainda não seria possível creditar o efeito de 6 gols à outra bola. Podem ser circuntânicas outras: time reserva, esquema tático, sorte, gramado, chuva... E se pudessemos fazer vários jogos, 30 por exemplo?

Aí, talvez...

Para as características do futebol teriamos de observar muito mais jogos. É caro e despropositado ver seleções como Portugal e Brasil se enfrentarem 300 vezes apenas pra ver se a tal da bola tem efeito ou não. Elas jogariam por jogar, para fazer número, extremamente diferente dos interesses postos em uma copa. No caso, a Adidas e a FIFA poderiam fazer isso com dois times genéricos pagos para fazer partidas-teste, sem substituições. Depois ampliar o teste para mais times. Mesmo para a empresa e para a FIFA, principais interessadas, isso seria muito caro. Mais caro ainda (menor relação benefício/custo) se o efeito fosse pequeno.

Na natação fez sucesso o novo maiô LZR da speedo, tanto que a suspeita de que ele poderia ter efeito no tempo dos atletas levou a FINA (Federação Internacional de Natação) a suspender o maiô em algumas competições, nem todos os atletas o tinham e dispunham de recursos para comprar. Mesmo aí, levantou-se questionamentos sobre os verdadeiros efeitos do maiô, os testes realizados poderiam não ser suficientes. Paira ainda a dúvida. Mas esse é mais um interessante exemplo de como os recursos tecnológicos podem fazer a diferença no esporte.

Para finalizar a polêmica da bola: ao que me parece, a diferença que pode ser creditada a ela é mínima. Mesmo que a média mais baixa de gols por jogos dessa copa se confirme, isso não é efeito da bola ou da pouca adaptação de alguns jogadores à ela, mas sim uma flutuação em torno da média de 2,5 gols por partida que é o normal das últimas três décadas.

E aí?! Será que vale a pena adotar a sugestão nada ortodoxa do Sócrates?



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