ENTREVISTA DO PROF. MARCOS CINTRA À “TRIBUTAÇÃO EM REVISTA” Ano 14, nº 54 Abri-Set, 2008.
Publicação do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil.
TEXTO NA INTEGRA:
"O professor Marcos Cintra é economista, doutor e mestre pela Universidade de Harvard. É professor titular da Fundação Getúlio Vargas, da qual é, atualmente, vice-presidente. É articulista do jornal Folha de São Paulo e Gazeta Mercantil e colaborador nas áreas de política e economia de mais de 300 jornais em todo o país. Autor de 10 livros e inúmeros artigos especializados sobre finanças públicas, teoria econômica e agricultura, no Brasil e no exterior, é o idealizador da proposta do Imposto Único, projeto que defende desde 1990, e que o tornou um debatedor assíduo sobre reforma tributária no Brasil. É um crítico ferrenho do atual sistema tributário brasileiro. Foi Secretário de Planejamento do município de São Paulo em 1993. Foi eleito vereador por São Paulo, cargo que ocupou até 1996 e para o qual foi novamente eleito em 2008. Exerceu o mandato de deputado federal entre 1999 e 2003 e presidiu a Comissão de Economia, Indústria e Comércio da Câmara dos Deputados em 2001.
Foi membro da Comissão Especial de Reforma Tributária, Comissão de Finanças e Tributação e da Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização. Foi secretário de Finanças da prefeitura de São Bernardo do Campo entre 2003 e 2006. É membro do Conselho Superior de Economia da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), do Conselho de Economia, Sociologia e Política da Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomercio) e presidente do Conselho de Economia da Federação de Serviços do Estado de São Paulo (Fesesp).
O que pensa a respeito da atual proposta de reforma
tributária?
A proposta de reforma tributária tem um defeito de fundo: não contribui para aumentar o número de contribuintes e assim reduzir a carga tributária individual. Ela centraliza a legislação do ICMS e quase cria um imposto único federal sobre valor agregado. Isto simplifica, unifica e pode resultar em economias operacionais e administrativas importantes para o governo federal. Mas, por outro lado, cria para o governo central um grande imposto cujos fatos geradores ser em grande parte coincidentes com a base do ICMS (a única exceção são os serviços que serão tributados pelo novo IVA-F, e não pelo ICMS, com algumas exceções). Os fatos geradores sofrerá tributação dupla, estadual e federal, cujas alíquotas devem ser somadas para caracterizar a carga tributária total incidente sobre eles. Com certeza ser・superior a 20-22%, o que dever・estimular a evasão e a sonegação
Quais os problemas que o senhor identifica?
A proposta é limitada. Ela silencia sobre importantes tributos. Há inúmeros detalhes, alguns oportunisticamente inseridos em meandros pouco explícitos do projeto e que demandarão análise detalhada. Mas chamo atenção inicialmente para alguns aspectos gerais:
1 – A reforma é parcial. Não abrange tributos como o IR, o IPI e os impostos municipais, contemplando apenas tributos sobre o consumo. É perfunctório quanto à desoneração da folha de pagamentos;
2 – Não há indicações quantitativas sobre os impactos das medidas, e nem sobre alíquotas, bases e formas de cálculo. Convém lembrar que em matéria tributária o diabo mora nos detalhes;
3 – Altera critérios de partilha fiscal. Como ponto positivo inclui novos tributos federais nos mecanismos de divisão da arrecadação. Por outro lado, dificulta a apuração para saber se Estados e municípios receberão mais ou menos recursos;
4 – Desconstitucionaliza critérios de partilha do ICMS. Isso vai prejudicar as capitais e os grandes municípios brasileiros;
5 – Critérios de partilha incertos. Os métodos de enforcement não estão claramente definidos, principalmente porque os repasses não serão de cima para baixo (União para Estados e Municípios). As transferências serão laterais (entre Estados). Não se sabe quanto vai custar a estrutura de fiscalização, quem irá fiscalizar e nem se os mecanismos de punição de estados que não repassarem o ICMS serão eficazes;
6 – Incertezas dos impactos do ICMS no destino. As compensações pelo Fundo de Equalização são incertas e subjetivas, não dando garantias seguras aos estados perdedores;
7 – Reforma protelatória. O governo pressupõe que governadores e prefeitos só pensam em seus respectivos mandatos e que aceitarão azedumes se ocorrerem daqui a dez ou vinte anos;
8 – Nota fiscal eletrônica. ノ uma medida ingênua e de difícil execução já que gera custos para sua instalação, não considera o ambiente sócioeducacional da população e nem que a informalidade é quase uma regra no Brasil. Será uma “espada de Dâmocles” sobre a cabeça dos estados na medida em que sua não implementação o fará com que eles não participem do Fundo de Equalização. Se o governo acha que ela resolve o problema da sonegação, é bom lembrar que basta tirar o aparelho da tomada que a operação não será registrada;
9 – Abertura para a multiplicação de alíquotas. Os especialistas em IVA consideram ideal a existência de apenas uma alíquota ou no mínimo duas ou três.
O senhor tem abraçado causas polêmicas como o Imposto Único. Por que o imposto único?
A idéia de um imposto único sobre as movimentações financeiras nos bancos representa uma revolução na estrutura tributária e fiscal do País. A idéia é simples: eliminar todos os tributos arrecadatórios e substituí-los por um tributo sobre movimentação bancária, semelhante à CPMF, que foi um tributo testado e que funcionou bem e barato, insonegável e justo para todos, pois se todos pagam, cada um paga pouco. O Imposto único foi idealizado visando combater a principal anomalia do sistema que é a sonegação, reduzir o custo para o governo e para o contribuinte e simplificar nossa caótica estrutura de impostos. O projeto que cria o Imposto único Federal (PEC 474/01) foi aprovado por unanimidade por uma Comissão Especial criada para analisá-lo na Câmara dos Deputados e hoje está em condições de ser votado.
Como se enquadraria o Imposto Único dentro da atual proposta do governo federal de uma reforma tributária?
A reforma tributária vai voltar a ser debatida e o projeto do imposto único é a alternativa viável para o País racionalizar a estrutura de impostos. É o projeto que a sociedade deseja, conforme apuraram 3 pesquisas de opinião. Os institutos Datafolha, CNT/Sensus e Cepac divulgaram levantamentos nos últimos anos que mostram que duas em cada três pessoas que conhecem o projeto do imposto único são favoráveis a ele. O imposto único é uma proposta que beneficia tanto o governo como os contribuintes. O poder público vai arrecadar de forma automática, rígida e barata e os trabalhadores e as empresas terão uma carga tributária menor em relação à atual por causa da expansão da base de cobrança. Quem paga pouco imposto sonegando vai começar a pagar mais e quem é sobretaxado para compensar essa situação vai recolher menos. A redução do custo tributário para as empresas e a classe média alavancará o mercado consumidor e os investimentos e, assim, a economia poderá crescer a taxas mais elevadas por um período longo.
Como o senhor recebeu a notícia da rejeição da CPMF? Por que o senhor defendia esse imposto?
A abrupta redução de R$ 40 bilhões do orçamento foi um ato demagógico e irresponsável. Alertei que a queda da CPMF seria compensada aumentando outros tributos e cortando despesas, o que penalizaria os mais necessitados. Não é por meio de atos como a extinção da CPMF que a carga tributária será reduzida e a estrutura será racionalizada. Ademais, foi lamentável que se tenha extinguido um tributo simples e barato como a CPMF. Eu jamais defendi a CPMF como um imposto a mais. Sou favorável à técnica de arrecadação dela. Aliás, ela surgiu a partir da proposta do imposto único em 1990, mas, infelizmente, acabou se tornando mais um imposto que contribuiu para o aumento acelerado do ônus tributário imposto à sociedade nos últimos anos. A CPMF provou que o imposto único é viável no Brasil.
Críticos dizem que a CPMF era injusta porque o pobre pagava mais. O que o senhor pensa sobre isso? Sem o tributo os que ganham menos serão beneficiados?
É mais um mito que se criou na esfera tributária e muitos passaram a repetir isso sem qualquer embasamento técnico. Alguns estudos foram realizados para apurar se a tributação sobre a movimentação financeira é regressiva e o resultado desmente essa tese. Com base na POF (Pesquisa de Orçamento Familiar) e na matriz interindustrial, ambas do IBGE, apurei que a CPMF representa 1,6% para uma pessoa que ganha um salário mínimo e 1,4% para outra de recebe mais de 20 salários mínimos, ou seja, é praticamente um imposto proporcional. No estudo “Parâmetros Tributários da Economia Brasileira”, publicado na revista Estudos Econômicos da FEA/USP (out./dez. 2006), os autores concluem que a CPMF é o tributo mais harmonioso da estrutura brasileira. Já a professora Maria da Conceição Tavares afirmou que é falso o argumento de que o imposto sobre circulação financeira penaliza os mais pobres, uma vez que em seus exercícios se constatou que as alíquotas efetivas são maiores para os mais ricos. Portanto, é falsa a afirmação que a CPMF é um imposto injusto porque o pobre é mais penalizado. O tributo é proporcional. O maior beneficiado pela sua extinção será o sonegador.
O senhor acredita que os parlamentares que votaram contra a CPMF se basearam em pesquisas que apontavam que a sociedade era contra o tributo?
Será que se fizesse uma pesquisa de opinião perguntando se o povo era contra ou a favor o imposto de renda, o ICMS, a Cofins, ou qualquer outro tributo, o resultado seria diferente? Será que a maioria diria que é a favor de algum tributo? Ninguém gosta de pagar imposto, seja no Brasil ou em qualquer lugar do mundo. Porém, esse é o preço que pagamos para viver numa sociedade civilizada. O povo não era contra a CPMF especificamente, mas contra a opressão tributária que assola nosso país, contra a complexidade que impõem pesados custos ao setor produtivo e contra a injustiça que obriga a classe média arcar com um elevado ônus para compensar por aqueles que sonegam. O que a sociedade deseja na verdade é um sistema simples e barato, situação que só a CPMF poderia proporcionar. Se tivesse que escolher entre acabar com a CPMF e manter impostos como o IR, o ICMS e a Cofins, por exemplo, ou mantê-la e utilizá-la para substituir outros tributos, o resultado seria parecido com um levantamento que fiz no ano passado onde 95% das pessoas disseram que preferiam a CPMF no lugar de outros impostos.
O senhor disse que a CPMF provou que o imposto único é viável para o Brasil. Como ele poderia ser implantado?
O ponto de partida poderia ser a PEC 474/01 que está no Congresso. Poder-se-ia acabar aos poucos com alguns tributos federais. A idéia é começar aliviando o ônus sobre a classe média assalariada, que é quem mais paga imposto no País. Seria extinto de imediato o imposto de renda das pessoas físicas e em seu lugar seria criado um IMF. Para estimular o aumento da oferta de empregos e a formalização de postos de trabalho, poderia ser extinto também os 20% de INSS cobrados sobre a folha de pagamento das empresas. São duas medidas que causariam um forte impacto positivo sobre os ganhos da classe média e sobre o mercado de trabalho. Depois outros impostos caros e complexos como a Cofins, o IPI e outros poderiam ser substituídos pelo IMF.
Qual seria a alíquota do imposto único?
O conceito de imposto único é um ideal a ser atingido. Idéia debatida há séculos. O problema é que nunca se conseguiu identificar um fato gerador que fosse suficientemente forte e amplo para permitir que com apenas um imposto o Estado Moderno arrecadasse o que ele necessita hoje para manter o seu nível de atividade. O grande problema sempre foi como identificar a base tributária, com alíquota baixa para evitar evasão fiscal e manter a carga tributária em 20%, 25% do PIB. E nunca se conseguiu isso. Eu já fiz o cálculo. Se eliminarmos todos os impostos no Brasil e ficarmos com apenas um tributo sobre movimentação financeira, a alíquota seria de 5,3% – 2,65% no débito bancário e 2,65% no crédito bancário – para mantermos a carga tributária em 36% do PIB, como é hoje.
O senhor acha que podemos caminhar para uma contribuição financeira que financie a Previdência brasileira?
Sim. Acho que vamos caminhar para isso. Essa proposta foi feita pela primeira vez em 1993 na famosa Comissão Ariosvaldo Mattos, presidida por Ariosvaldo Mattos Filho, diretor da escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas. Ele presidiu, a convite do então presidente da República, Itamar Franco, uma comissão composta pelos mais importantes tributaristas brasileiros. E uma das propostas que saiu naquele período foi exatamente esta. O sistema previdenciário brasileiro deve ser custeado com um tributo primeiro testado, com um tributo que incida sobre toda a sociedade. Porque o nosso sistema previdenciário não é um sistema de capitalização, é de repartição, é quase uma obrigação. É uma política pública de garantia de aposentadoria até o teto do governo.
Há viabilidade para se chegar a esse cenário?
Há interesse do governo em caminhar no sentido da chamada desoneração da folha de salário das empresas, que é a redução da contribuição patronal à Previdência, principal mecanismo de custeio do sistema previdenciário. A idéia seria desonerar, reduzir o imposto sobre a folha de pagamento e substituir isso por um tributo sobre movimentação financeira.
Esta é uma questão interessante, pois todas as conexões que tentam fazer, entre fato gerador e benefícios da Previdência Social, são abstratas. Como seria a alíquota desse imposto?
Seria um tributo com base ampla, de alíquota de 0,5% – ou 0,25% na entrada e 0,25% na saída –, que arrecadaria o mesmo montante de recursos que a contribuição patronal das empresas ao INSS, cuja alíquota é de 20% sobre a folha de pagamento. O mais importante é que não é apenas o Brasil que tem problemas de financiamento da Previdência. Porque essa vinculação entre a Previdência e o trabalho assalariado, ou folha de salários, está se desfazendo no mundo moderno. Hoje em dia, devemos levar em conta os processos de terceirização, autonomização no trabalho,
auto-emprego, poupança de mão-de-obra nos processos de produção. O que está acontecendo? A base tributária sobre a qual hoje se assenta o financiamento da Previdência está encolhendo em todo o mundo. E é uma base profundamente instável, varia de acordo com a conjuntura econômica. A Europa está discutindo essa questão ativamente – encontrar uma nova base de financiamento da Previdência que não seja a folha de salários das empresas, que está encolhendo. E, na medida em que encolhe, aumenta a base de cálculo, incentivando a economia informal. No Brasil há um estudo do professor (Celso) Pastore que mostra que a cunha fiscal sobre o trabalho é de 100%. Ou seja, o trabalhador assalariado leva para casa hoje 50% daquilo que está custando para a empresa. Não é possível um sistema deste.
Conversando um pouco sobre desenvolvimento. Gostaria que o senhor comentasse sobre a relação, hoje, do desenvolvimento com o desenvolvimento das instituições.
Uma abordagem interessante é discutir tributação e desenvolvimento, como o professor Eurico Santi está fazendo na FGV. Essa interdisciplinaridade é importante, essa preocupação em romper barreiras e analisar fenômenos como um complexo social. E a idéia do desenvolvimento econômico hoje está passando por um processo semelhante. Hoje, os grandes teóricos do estudo do desenvolvimento econômico no mundo todo não estão mais seguindo a linha clássica, que era analisar taxa de poupança, taxa de investimento, relação capital-produto, porque se tinha a concepção de que o desenvolvimento econômico era o resultado direto da poupança. Isso não é necessariamente verdade – há países que poupam muito e crescem pouco e vice-versa. Porque existem outros mecanismos que permitem o financiamento do desenvolvimento econômico. Aí se passou a um estudo de outras variáveis. Durante as décadas de 1940, 1950, 1960 e 1970 discutiu-se a questão da inovação tecnológica. Aí então o economista começou a concentrar sua preocupação não mais na poupança, mas no desenvolvimento tecnológico como o grande motor do desenvolvimento econômico. Mas esta tendência também está sendo superada. Hoje, quando se discute desenvolvimento econômico ele tem uma visão muito mais institucional e discute segurança jurídica, estabilidade institucional, boas instituições, boa educação, segurança, saúde, como componentes importantíssimos na definição de potencial de crescimento de uma economia. É essa visão interdisciplinar que está presidindo a preocupação com o tema desenvolvimento.
O senhor fala que hoje os economistas estão preocupados com as instituições, com a segurança jurídica, entre outros assuntos. Podemos passar para a discussão do gasto público e da reforma do Estado?
O Estado brasileiro hoje não é transparente. Não sei se em outros países poderíamos dizer a mesma coisa. Mas o Poder Público é muito transparente. Ocorre que ele tem regras de proteção, de autodefesa que acabam tirando a transparência do sistema. Só que o mundo moderno está ficando cada vez mais sofisticado. A globalização está fazendo com que conceitos antigos percam a validade. O Estado está perdendo capacidade até de tributar seus entes nacionais. A incapacidade de o administrador público entender o que se passa no mundo globalizado acaba tornando menos transparente o Poder Público. Hoje a proliferação de normas que regem a questão de preço de transferência é tão absurda que vai nos levar a uma Torre de Babel. Novos conceitos surgem a cada momento. Os dogmas tributários refletem ainda uma economia do século XIX. Hoje as empresas produzem de maneira descentralizada no mundo inteiro. No Brasil temos um problema muito sério. A sociedade brasileira é profundamente estadista. Ela adora o governo. O povo brasileiro depende do governo. É uma concepção diferente de Estado, por exemplo, dos povos anglo-saxões.
Mas estamos vivendo um processo no Brasil, apesar de todas as críticas que fazemos ao Estado, no fundo, estamos avançando. Acredito que o Brasil, apesar de todas as dificuldades que vivemos, finalmente está ponto de crescer como uma grande sociedade. Finalmente conseguimos nos inserir na comunidade financeira internacional como um país sério, do ponto de vista econômico, como uma alternativa de investimento confiável. E à medida em que isso acontece, as instituições vão melhorando. Aliás, este é um debate. São as instituições que geram crescimento ou o crescimento que gera boas instituições? A segunda hipótese parece mais provável. À medida que o Brasil cresce, vamos aperfeiçoando as nossas instituições e começamos a ter uma perspectiva de sermos uma sociedade mais progressista e de realizarmos uma sociedade mais justa, mais igual, mais igualdade de distribuição de renda. O Brasil vai melhorar.
Há um senso comum de que o sistema tributário funcionaria como uma “mão invisível” que regula a economia, cuidando da igualdade entre as pessoas. Mas, há também especialistas que defendem a tese de que esta “mão invisível” pode não agir por meio do sistema tributário, mas por via de incentivos financeiros. Qual é a opinião do senhor sobre essas diferentes posições?
Incentivo fiscal como instrumento de desenvolvimento econômico e de política pública é profundamente ineficiente. Os exemplos que temos no Brasil são gritantes e o mais impressionante de todos eles é a questão da Sudene. Esse órgão foi responsável por um grande programa de incentivo fiscal orientado para o desenvolvimento da Região Nordeste, que não gerou absolutamente nada do objetivo a que se propunha. Muito pelo contrário, houve desvio e má aplicação de recursos. Outro exemplo é a Zona Franca de Manaus, que tem profundas distorções econômicas. As empresas se instalam lá unicamente porque têm isenção do IPI, mas há um aumento de custos com deslocamentos. O incentivo fiscal é a maneira mais ineficiente de o Estado promover desenvolvimento econômico. Acho que tributação tem de ser universal em função da capacidade contributiva efetiva e que a transação financeira é a melhor maneira de se medir isso.
Tem de ser um sistema que não puna o sucesso. Sistemas excessivamente progressivos no mundo globalizado induzem à fuga de capitais. Hoje a Europa está reduzindo as alíquotas mínimas e uniformizando impostos para evitar esse fenômeno. Um sistema razoavelmente proporcional, ligeiramente progressivo e universal, para mim, é a melhor maneira de arrecadar. Com isso, o Estado pratica política social e de desenvolvimento via gastos públicos, o que efetivamente transfere renda. Desse modo, você consegue orientar melhor os recursos em vez de uma política de incentivos que é muito abrangente, apesar de o Estado não ser eficiente no direcionamento desses recursos. Portanto, isso é mais eficiente do que atirar com chumbo grosso em incentivos fiscais, que acaba não tendo controle de quem se beneficia".